1972 ano do caos na FC em Portugal? Bom, pelo menos não era apenas a Brasília Editora a trocar as voltas aos leitores. Considerem a surpresa e o espanto de quem pegasse no oitavo volume da colecção DH Ciência das Edições Dêagá esperando levar para casa UMA INFINIDADE DE ESTRELAS de Isaac Asimov, a terceira colectânea dos seus ensaios (de que a Dêagá publicara já A Ciência, os Números e Eu e Da Terra ao Céu), apenas para descobrir que acabara de adquirir a tradução portuguesa de A Wilderness of Stars, antolgia organizada em 1969 por William F. Nolan.
Certamente o leitor não saíria muito prejudicado, pois o conjunto de 10 contos que exploram as consequências e desafios da exploração espacial, não deixará de compensar largamente qualquer apreciador de FC (embora possa desgostar um pouco aquele leitor que procurasse apenas os ensaios do Bom Doutor). Entre as histórias seleccionadas no ano em que o Apolo XI levou o homem à Lua, contam-se dois magníficos contos de Walter M. Miller (que abrem e fecham o volume), um interessante conto sobre uma regata espacial da autoria de Arthur C. Clarke, um clássico conto marciano de Bradbury, um conto do próprio organizador, que todos reconhecerão como sendo o autor do não menos clássicos Logan's Run e Logan's World, para além de trabalhos de Sheckley, Chad Oliver, Charles E. Fritch e Ray Russel.
Para os amantes do caos, este modesto volume (196 páginas) de grande ambição, ainda oferece a "surpresa" de, entre as páginas 96 e 97, reproduzir novamente as páginas 81 a 96, sem porém obliterar qualquer página da história interrompida.
No texto de contra-capa, o leitor reparará que o editor salienta o facto de esta ser a "segunda antologia de Ficção Científica que incluímos na presente coleccção", bem traduzindo uma diferença fundamental entre o mercado de então e o mercado actual onde, com excepção de colectâneas de autor e das antologias necessariamente temáticas que a Saída de Emergência vem organizando (A Sombra Sobre Lisboa, A República Nunca Existiu), o conceito de colectânea de vários autores parece ser totalmente anátema. É certo que tal se deve à constatação de que no âmbito da literatura de género as formas curtas encontram-se moribundas, tendo perdido a importância que detinham entre guerras e durante a Segunda Guerra Mundial. No entanto, não é menos certo que a ausência de traduções para português de algumas das antologias anuais que compilam o que de melhor se vai fazendo durante o ano, como as de David Hartwell, Robert Silverberg, Stephen Jones e - menos a meu gosto - Gardner Dozois, dificulta o primeiro contacto entre os leitores que desejam experimentar algo novo e os novos autores que pretendem começar a escrever num género que mal conhecem.
Também nisso, apesar do caos, da desordem, da confusão e das más traduções, o Portugal dos anos 70 - e em parte o Portugal da ditadura - tinha mais para nos oferecer do que o Portugal de hoje... que nos oferece apenas a porta aberta e a oportunidade de por ela sairmos. Abençoado seja por isso.
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