terça-feira, 25 de novembro de 2008

Um livro por dia: TRON



Para os jovens de (e menos jovens) de hoje, habituados às sumptuosas criações CGI de qualquer mega-produção hollywoodesca, será difícil imaginar o impacto que teve na minha geração o aparecimento do filme TRON (1982) de Steven Lisberger. Numa altura em que não existiam Playstation nem X-Box, onde os ZX-Spectrum e os MSX eram apenas uma promessa, o filme dos estúdios Disney foi ao mesmo tempo um deslumbrante espectáculo visual e o motor de uma revolução na carreira profissional de muitos colegas meus. O impacto do filme é difícil de avaliar mas é sentido ainda no universo dos hackers, dos video-jogos, dos comics e do cinema. As célebres corridas de Lightcycles (um dos elementos do filme), aquelas motas que erguiam uma parede atrás de si visando a destruição dos adversários, tornou-se um dos jogos arcade e de pc mais memoráveis de sempre, influenciando ainda hoje incontáveis sequências cinematográficas, tal como é possível comprovar no recente Speed Racer (2008) dos irmãos Wachowski.

Quando em 1983 a Europress apresentou a sua colecção Bolso Noite, nada mais natural que escolher TRON, novelização do argumento do filme levada a cabo em 1982 por Brian Daley, afamado autor de tie-ins do universo Star Wars (sobretudo para a rádio), como primeiro título de FC a publicar.

A Bolso Noite, seguindo o exemplo da anterior Colecção Negra do Círculo de Leitores, incluía obras de quatro géneros literários - o policial/thriller (volumes de capa vermelha), Horror (capa preta), Ficção Científica (Capa Azul) e Western (capa amarela) - publicando autores nacionais e estrangeiros e dando a conhecer ao público português alguns autores magníficos como C. J. Cherryh, alguns títulos incontornáveis como Um Caso de Consciência (James Blish, 1958), e vários títulos dos nossos ases do pulp como Luís Campos (que dirigia a colecção), Roussado Pinto, ou o meu conterrâneo e amigo, Fernando Melim (um dos nossos poucos autores a apostar no horror, tendo aí publicado A CRIPTA e UM TÚMULO PARA NICODEMO).

Foi com esta colecção que me estreei na leitura de FC séria, mais concretamente com Héstia de C. J. Cherryh, de quem a Bolso Noite viria ainda a publicar uma extraordinária colecção de contos (O Sol Caiu) e uma novela extremamente interessante (Vaga sem Praia). Li TRON depois de ter visto o filme - numa época em que não existiam gravadores de vídeo nem DVDs, as novelizações eram a única forma de voltarmos a "ver" os filmes que mais nos tinham marcado sem estarmos dependentes da arbitrariedade da programação televisiva - e para um adolescente que acarinhava já aspirações de escrita (como todos os adolescentes, mais dominado pela dimensão visual do que pela dimensão literária), foi um dos primeiros objectos de estudo, através do qual tentava aprender a traduzir imagens por texto. Lembro-me de tentar reproduzir nas minhas próprias histórias desse período (1984) a descrição que o livro apresentava de um dos efeitos especiais que mais me fascinara no filme: a desconstrução das estruturas luminosas dos objectos.

Assim é também a memória nostálgica de quando o mundo era jovem: luminosa e sujeita a desconstrução...


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