domingo, 5 de junho de 2011

Domingo a 4 Cores (1): FLASHPOINT: BATMAN: KNIGHT OF VENGEANCE #1

Com a anunciada intenção da DC renumerar todas as suas séries a partir do #1 já em Setembro, com o lançamento simultâneo de 50 “novos” títulos (the mind boggles) só nesse mês, todos os olhos estão concentrados no arco narrativo FLASHPOINT, conduzido pelo mestre Geoff Johns (texto) e o veterano Andy Kubert (desenhos), que nos apresenta (outra vez) uma realidade alternativa do universo DC onde Superman se encontra prisioneiro do governo, Cyborg é o herói central da cronologia DCU e o manto de Batman é vestido por Thomas Wayne, pai do histórico Bruce Wayne. É esta última alternativa que Brian Azzarello e Eduardo Risso exploram na mini-série de três números FLASHPOINT: BATMAN: KNIGHT OF VENGEANCE. Partindo da possível vida alternativa do casal Wayne proposta (e reputada falsa) no arco narrativo BATMAN R.I.P. e posteriormente na série BATMAN & ROBIN, Azzarello apresenta-nos aqui um Batman muito mais cínico e violento do que aquele a que estamos habituados. Dado a resmungos quase ininteligíveis, financia a sua luta contra o crime através da exploração de uma rede de casinos semi-ilegais, ao mesmo tempo que controla a polícia privatizada de Gotham.



Quando os filhos gémeos de Harvey Dent são raptados pelo Joker, Batman tem que os recuperar sãos e salvos sob pena de o procurador lançar uma guerra contra os seus casinos e hotéis. Numa primeira tentativa de localizar o Joker, Batman segue o rasto de uma série de desaparecimentos de sem-abrigo e drogados , acabando por enfrentar um Killer Croc on steroids nos esgotos da cidade, naquele que é um dos quadros mais impactantes que me lembro de encontrar no DCU: os gemidos que ecoam nos esgotos, parecendo anunciar o inferno (hell… hell…) acabam por se transformar em pedidos lancinantes de ajuda (hellp uss…), oriundos de um grupo de indigentes amputados, claramente um depósito de alimento fresco conservado pelo assassino. Os vários níveis de alegoria são transparentes, mas ajudam a firmar este novo Batman na consciência dos leitores, tal como sucede com a recriação daquele momento seminal em que o assaltante surpreende a família Wayne à saída do cinema, e lança a mão ao colar de pérolas que se desfaz num turbilhão de bolhas de ar que passam do amarelo lamacento ao vermelho sanguíneo numa tradução visceral da asfixia de Thomas Wayne prestes a ser afogado pelo Killer Croc.



A Gotham representada por Risso é tão esquálida e desbotada que os próprios néons do casino de Wayne parecem ser sugados pela palidez dominante, e apenas num único momento o por do sol confere algum calor às fachadas vertiginosas, que surgem das brumas da poluição que se ergue do solo como o hálito pútrido das entranhas urbanas.Com uma primeira parte quase expositiva, e um segundo acto praticamente desprovido de texto, em que a narrativa fica entregue aos visuais de Risso e Patricia Mulvihill (cores), este primeiro número é um magnífico exemplo de concentração narrativa, apresentando ao leitor um mundo rico em textura, preenchido de referências que permitem perceber os vários pontos de contacto entre este universo e a cronologia DCU standard, ao mesmo tempo que nos desafia a apreciar um Batman tão ou mais violento que os seus próprios adversários. Sem dúvida, um dos títulos mais interessantes do batuniverso, que não tem sido escasso em títulos interessantes nos últimos anos.

Domingo a 4 Cores (1): BATMAN: GATES OF GOTHAM #1

No pólo oposto de BATMAN: ARKHAM CITY situa-se este primeiro número de uma outra mini-série de cinco, com argumento de Scott Snyder e Kyle Higgins, que a arte de Trevor McCarthy traduz magistralmente num chiaroscuro cheio de contrastes. Na verdade é a arte, e sobretudo a cor (a cargo de Guy Major), que conduz o olhar do leitor pela geografia ucrónica de Gotham, uma cidade de sombras e trevas, quer literais, quer figurativas. Numa narrativa que encontra o seu início em 1881 no projecto de arranha-céus e pontes com que os founding fathers da cidade (as quatro grandes famílias, entre as quais as famílias Wayne, Cobblepot, Elliot, e uma quarta ainda não desvelada) pretendem escorar o futuro, e estendendo-se à destruição terrorista de três dessas pontes no presente que serve de ponto de partida a esta BATMAN: GATES OF GOTHAM, é o uso ponderado de pequenas manchas coloridas (luzes de veículos de emergência, candeeiros de iluminação pública) numa paisagem soturna, muitas vezes cortando a página de ponta a ponta, que atrai o olhar do leitor e adensa ainda mais a atmosfera opressiva de uma cidade escura e cheia de mistérios.



Especial destaque merece o uso dos vermelhos, seja no vestuário, seja na iluminação interior do cockpit do submersível com que Batman se depara com cadáveres em suspensão nas águas lamacentas do rio, ou mesmo nas luzes das ambulâncias e carros de polícia, que permite acentuar ainda mais a ameaça que pende sobre a cidade.


A acção é representada em sequências bastante dinâmicas (a fazer lembrar o DAREDEVIL de Miller, mas muito aquém dele), ora com concentração de movimentos num único painel, ora com a sua distribuição em pequenos pormenores gestuais contaminantes de toda a página. O visual de Gotham é aquele a que já nos habituamos, uma cidade entre o gótico europeu, uma metrópole pulp decadente, com os céus pontilhados de zeppelins que seriam anacrónicos nos céus de Metrópolis, e uma moderna paisagem urbana de arranha-céus vidrados entre os agulhões de alvenaria da viragem do século. Neste primeiro número, Batman (Dick Grayson, claramente já no universo BATMAN, INC.), auxiliado por Red Robin, Robin e Cassandra Cain (ex-Batgirl, agora Blackbat), começam a juntar as peças deste puzzle histórico, que termina com um delicioso cliffhanger de contornos retro-pulp quando o suposto terrorista (que Cobblepot, o Penguin, nos informa vestir “a rather interesting lookng suit”) se revela com uma vestimenta retrofuturista que nos faz invocar imediatamente imagens de potenciais crononautas wellsianos. Uma série a seguir com atenção.

Domingo a 4 Cores (1): BATMAN: ARKHAM CITY #1

Não sou grande apreciador de tie-ins para videojogos, mas depois de ter sido convertido pela série DC UNIVERSE LEGENDS ONLINE, não resisti a experimentar este primeiro número de uma série limitada de cinco que visa fazer a ponte entre os jogos BATMAN: ARKHAM ASYLUM e BATMAN: ARKHAM CITY, ambos escritos por Paul Dini e com o visual a cargo de Carlos D’Anda, dupla que assina também esta mini-série. Cronologicamente situada um ano depois dos eventos descritos no primeiro jogo, BATMAN: ARKHAM CITY apresenta-nos os resultados da revolta dos prisioneiros do Asilo epónimo, quando Quincy Sharp, à data seu director e agora Presidente da Câmara de Gotham resolve apertar o cerco aos super-criminosos (e aos outros) murando metade da cidade e convertendo-a numa prisão à la ESCAPE FROM NEW YORK (John Carpenter, 1981). Como tie-in, este primeiro número cumpre a sua função de apresentar sumariamente o universo narrativo – se não mesmo demasiado sumariamente – precipitando uma catadupa de acontecimentos em ritmo verdadeiramente pulpesco: com o Joker (deliciosamente insano) uma vez mais prisioneiro de Arkham e a ser carcomido pelo lento aproximar da morte (que alguns dos responsáveis da instituição não se importariam de acelerar), encerrado numa cela a poucos metros daquela em que Harley Quinn suspira por ele, sabendo apenas que está vivo pelo louco gargalhar que ecoa pelos corredores góticos do edifício, Dini introduz-nos um par de irmãos de físico aumentado por injecções da titan formula contrabandeada para Gotham e roubada a Two-Face, e que pretendem assenhorear-se da cidade durante a inauguração do novo edifício da Câmara Municipal, numa trama que se repete vezes sem conta nas histórias de Batman, seja nos comics, seja no cinema. Obviamente, Batman intervém, desta vez equipado com botas e luvas revestidas com espuma explosiva que deflagra com o impacto da pancadaria, mas embora consiga derrotar os irmãos Trask (T&T), não consegue evitar que estes se façam explodir num martírio apoteótico que provoca trezentos mortos e a total obliteração do novo edifício. Ao chegarmos ao final deste primeiro número, todas as rodas foram colocadas em movimento, lançando uma série de ganchos narrativos que estruturarão o plot nos quatro números restantes: apercebendo-se da ameaça de morte que pende sobre o Joker, Harley desenvolve claramente um plano, e ficou mais do que óbvio que quer o mayor Sharp, quer os irmãos T&T, são marionetes de alguém que se encontra nos bastidores. Há nitidamente um sinistro arquitecto por detrás destes acontecimentos inaugurais, e a disposição das peças promete uma sequência alucinante.



Os desenhos de D’Anda, muito melhor na arquitectura do que nas figuras humanas, capturam adequadamente o ambiente da narrativa mas sem deslumbrar, e acompanham a trama encavalitada de Dini sem dificuldades de maior. Um começo interessante apesar de algo banal, prejudicado sobretudo pela tremenda concentração narrativa em tão poucas páginas. De destacar o excelente trabalho de cor de Gabe Eltaeb.