domingo, 2 de agosto de 2015

PARA MAIORES DE 18: Uma Antologia Erótica de Literatura Fantástica




Diz-nos a Biologia, que o sexo foi uma das mais importantes “descobertas” da natureza. Ao permitir a recombinação do ADN, veio facilitar a introdução e mais fácil transmissão de novas e benéficas formas de adaptação ao meio, para além de ter permitido desenvolver mecanismos sensoriais de intensificação do prazer. Um dos quais é a própria Imaginação.













E a Imaginação é a província de eleição dos géneros literários da Ficção Científica e do Fantástico. Olhando para as capas híper-coloridas das primeiras publicações na era dourada das “pulps”, a Ficção Científica, o Horror e a Fantasia pareciam regozijar-se naquilo que um dos pioneiros objectores do género classificou como “desbragadas orgias de sexo em letra de forma”. Nessas vívidas ilustrações de um dinamismo assoberbante, homens e mulheres parecem ansiar por um célere regresso ao paraíso terrenal, onde as roupas – esfarrapadas, quando não originalmente desenhadas de forma minimalista – não passavam ainda de um ténue cintilar nos sonhos de futuros costureiros, e onde todos os elementos de composição transmitem a vontade de copular. Tentáculos, fálicos foguetes, espadas e pistolas de raio, monstros lúbricos e donzelas semi-nuas, comungam de uma pornotupia que, para confusão e desconsolo dos muitos adolescentes que largavam as suas parcas economias nos quiosques da Grande Depressão, raramente encontrava lugar nas páginas interiores das revistas, tão puras que poderiam ser lidas em voz alta no púlpito das Igrejas (não foram muitos outros, e de outra ordem, os elementos que proibissem uma tal leitura).


Foi só na histórica edição da Startling Stories de Julho de 1952, que o sexo aflorou como tema principal de uma história de Ficção Científica, no clássico “The Lovers” (“Os Amantes Cósmicos”) de Phillip José Farmer. Se, até então, por via do carácter monstruoso das uniões carnais (tentadas, mais do que consumadas) com mortos reanimados, alienígenas e BEMs das mais variadas morfologias tentaculares, que iam surgindo em publicações como a Marvel Science Stories, Weird Tales, Horror Stories ou os vários Spicy isto-ou-aquilo, a relação com o sexo se apresentava como algo horrível, tétrico e mórbido, transparecendo uma ideia juvenil das funções corporais, com Farmer, apesar do sexo ocorrer para lá das cortinas da narrativa, esta apresentava-se já como algo de erótico.

 


A revolução, porém, não foi imediata, e só um par de anos mais tarde autores como Theodore Sturgeon e Robert A. Heinlein se juntaram a Farmer na vanguarda da introdução do sexo na literatura de FC&F. Com as portas da censura escancaradas por estes autores, o sexo surgiu abundante nas páginas da New Wave revolucionária e contracultural dos anos 60, não como sexo erótico, mas como sexo político. Onde antes era proibido copular, agora era proibido copular sem uma agenda sociológica pré-determinada e politicamente correcta. Harry Harrison, em Star Smashers of the Galaxy Rangers (1973) ridicularizou a corrente subterrânea de erotismo subjacente às primeiras space operas, quase ao mesmo tempo que John Norman se tornava o anti-cristo da FC&F ao sublimar a corrente subterrânea de erotismo sado-masoquista dos primeiros romances planetários na sua saga de Gor (1966-2013).
 
 

Entre os dois extremos, como não podia deixar de ser, escondeu-se a virtude. Ao longo dos anos 70 e 80, autores como Andrew J. Offut, Sharon Green, Jo Clayton, Robert E. Vardeman, Victor Milán, Jane Gaskell e o sempre presente Phillip José Farmer, continuaram a produzir obras de transbordante erotismo sem que o sexo tenha que ser despojado das suas manifestações mais prazenteiras ou constantemente complexado e problematizado sob procústeas interpretações feministas e opressivas.


O que se pretende com esta antologia é recuperar a arte perdida do erotismo na Ficção Científica e no Fantástico, aqui se incluindo todos os sub-géneros, desde a Fantasia Épica ao Weird, passando pelo Steampunk, a Sword and Sorcery, a Space Opera, o RetroPulp, ou o Policial Macabro. E para isso a Saída de Emergência convidou-me, juntamente com o Luís Filipe Silva, para levar a cabo a tarefa de seleccionar um conjunto de histórias onde o sexo titila e estimula, e os únicos complexos de culpa que gera são os próprios dos pequenos prazeres inconfessáveis que guardamos nos recônditos mais profundos da mente. Pretendemos, porém, contos e noveletas eróticas, mas não pornográficas; com isto não queremos dizer que o sexo não possa ser explícito, mas sim que o sexo deve estar subordinado à história, e não a história ao sexo. E pretendemos histórias originais – se viu a recente série Femme Fatales, ou as clássicas The Hunger e Masters of Horror, se leu os livros de Laurell K. Hamilton, Peter Saxon, Scott Ciencin, Charlaine Harris, Paolo Eleuteri Serpieri ou Aishling Morgan, lembre-se que eu e o Luís também as vimos e também os lemos.

O Regulamento, bem como informações adicionais, pode ser consultado aqui.

Apesar de uma iniciativa deste género não ser inédita em língua Portuguesa - só no Brasil editaram-se pelo menos três entre 2001 e 2011 - é pioneira em Portugal, ao tratar-se de uma antologia de contos originais, escritos em Português, o que a separa desde logo da única publicação semelhante entre nós, a há muito esgotada O Sexo na Moderna Ficção Científica (Antologia de Autores Franceses), organizada em 1976 por Isabel Meireles para as Edições Afrodite de Fernando Ribeiro de Mello, com magníficas ilustrações de Nuno Amorim. Por isso, a Saída de Emergência abrirá em breve um espaço virtual onde eu e o Luís Filipe Silva regularmente partilharemos ideias, observações, notas e, no geral, daremos conta do andamento do processo de selecção dos contos, como forma de ajudar os autores interessados a irem de encontro às nossas pretensões.


Também com esse objectivo, publicarei até Dezembro, aqui no Blade Runner, alguns textos abordando algumas obras (livros, contos, filmes, ou BDs) ilustrativos daquilo que já se fez e que, de certa forma, considero como bons ou maus exemplos do que pode ser feito e do que (pelo menos da minha parte) pretendo para a antologia. Obviamente, o processo de selecção irá muito além dos meus próprios gostos (não só os gostos do Luís, como os méritos de cada texto submetido a apreciação, serão ponderados por nós e pelos editores), mas seria ridículo pretender que as preferências subjectivas dos organizadores não terão interferência nas escolhas. E, porque aproveitarei este necessário recurso ao blogue para tentar reanimar uma vez mais o projecto Blade Runner, os posts - espero - não se limitarão àqueles pertinentes à antologia, pelo que estes serão identificados pela epígrafe (e etiqueta) +18.

E, dito isto, bem-vindos de novo ao blogue, e ponham a imaginação a trabalhar, aproveitando a oportunidade de integrar mais uma das já célebres antologias da Saída de Emergência e da Colecção Bang! que desde A Sombra Sobre Lisboa (2006) até à Lisboa no Ano 2000 (2013), sempre marcaram de forma indelével o panorama editorial do Fantástico português.