segunda-feira, 12 de abril de 2010

Cinco Anos de Estouro


Foi em Novembro de 2005 que a primeira BANG! (#0 - confesso que nunca percebi a lógica disto) surgiu no decurso do Fórum Fantástico, o primeiro organizado sob essa designação pela Safaa Dib e pelo Rogério Ribeiro, com o apoio da Épica - Associação Portuguesa do Fantástico nas Artes. Aqueles que acompanharam de perto o(s) acontecimento(s), terão certamente na sua colecção um exemplar da tiragem da revista que apresentava a capa completamente despida de lettering. Erros e enganos que ajudam a valorizar estas pequenas coisas, a enriquecer colecções do género e a cimentar uma memória colectiva do género em Portugal.

Esse primeiro número, que no segundo dia do Fórum já se apresentava normalmente vestido, anunciando na capa um artigo sobre "Saramago: o Nobel da Ficção-Científica", da autoria de "José" Candeias, e a pré-publicação de Salomão Kane, marcava também a estreia em Portugal de Lavie Tidhar, com o conto Aranhas Temporais, Teias Espaciais, que acompanhava ficção portuguesa de David Soares, Ágata Ramos Simões e João Ventura. Um receita eclética que se revelou de sucesso, apesar de algumas queixas quanto ao arranjo gráfico demasiado próximo do de um "mero" fanzine. Afinal, a BANG!, era a primeira revista séria exclusivamente dedicada ao Fantástico, estatuto que foi consolidando ao longo dos dois números em papel que se seguiram.

Efectivamente, quando a BANG! surgiu, sob direcção de Rogério Ribeiro, os fanzines nacionais apresentavam ainda alguma agitação. O Rogério assumia as rédeas da revista após ter assegurado a edição de cinco números do Dragão Quântico, onde também colaborou Ricardo Loureiro, editor do Hyperdrivezine, do Câmara Obscura e do Nova. Com o número 3, a BANG!, afectada por vendas escassas, transita para o formato digital, ganhando número de páginas, maior variedade de conteúdos e mais maturidade crítica e literária, até se tornar a revista de referência no Fantástico e sobrevivendo ao progressivo e paulativo desaparecimento de todos os fanzines e e-zines que durante alguns anos, e graças aos esforços do Rogério Ribeiro, do Ricardo Loureiro, do Telmo Pinto e do Tiago Gama contribuiram para o aparecimento de novos autores e para o enriquecimento do género.

Com o seu número 7, oitavo número da revista, e com mais uma gralha de colecção na capa (datada de Fevereiro de 2009), a BANG! retoma a edição em papel, desta feita sob direcção de Luís Corte-Real e Nuno Fonseca e com um grafismo profissional e praticamente irrepreensível. Nuno Fonseca, no seu editorial, promete "renovar constantemente, pisar novos territórios e abraçar novas ideias", e fiel a esta determinação a revista diversifica ainda mais os seus conteúdos, estendo a cobertura ao cinema e à banda desenhada (duas lacunas que era importante preencher) e deixando de fora apenas a música - e creio que a revista ficaria perfeita com uma secção semelhante à que Douglas E. Winter assina na VideoWatchdog.

A par da ficção de Vasco Curado (presença habitual da BANG!), Valéria Rizzi (uma surpresa para quem não "a" conhece), Gerson Lodi-Ribeiro, Renato Carreira e Richard Matheson, os ensaios de David Soares (uma magnífica análise do Ensaio Sobre a Cegueira de Saramago e do superior The Day of the Triffids de John Whyndham), António de Macedo (sobre uma fabulosa biblioteca digna dos sonhos de Borges) e José Carlos Gil (conclusão do seu ensaio sobre Lovecraft iniciado no número anterior) ajudam a tornar este número da revista numa peça de qualidade invejável. É, sem dúvida, um dos melhores números da BANG!, confirmando a curva ascendente de qualidade que vinha prometendo desde a edição inicial há quase cinco anos.

Infelizmente, o editorial de Luís Corte-Real agourava já tempos menos bons. Quando o editor diz, "Mesmo que vendamos todos os exemplares impressos, a editora não vai ganhar um cêntimo", é sempre de temer o pior. O que é pena, pois a BANG! é uma revista imprescindível para qualquer pessoa que leve a sério o Fantástico em Portugal. Mais do que isso, é assumidamente a única revista portuguesa dedicada ao Fantástico, sobretudo depois de a esperança prometida pela Dagon se ter desvanecido com um número experimental verdadeiramente medíocre e o subsequente desaparecimento nos esconsos de uma vanity press. É por isso dever de todos nós fazer saber à Saída de Emergência e aos editores da BANG! que não prescindimos da revista e que não prescindimos da revista em papel. Afinal, é a única que temos.

Numa tentativa de minorar as despesas, a Saída de Emergência resolveu voltar a organizar a revista com a "prata da casa"; sai, por isso Nuno Fonseca, a quem devemos agradecer a co-organização de um número da revista verdadeiramente memorável. A substituí-lo, Safaa Dib assume a direcção da revista, representando uma garantia de qualidade e de continuidade no trabalho de excelência que a BANG! vem desenvolvendo em prol do Fantástico.

Espero, por isso, com ansiedade pelo próximo número.

13 comentários:

Anónimo disse...

Hummm, nova mudança de editor? E seria fácil apoiar a revista se o canal de distribuição se alargasse mais. Eu por mim não tenho grande problema em encomendar online mas, infelizmente, ainda somos uma excepção.

E não foste algo duro com a Dagon? Os primeiros passos são sempre mais difíceis de dar.

Roberto Bilro Mendes disse...

"Mais do que isso, é assumidamente a única revista portuguesa dedicada ao Fantástico, sobretudo depois de a esperança prometida pela Dagon se ter desvanecido com um número experimental verdadeiramente medíocre e o subsequente desaparecimento nos esconsos de uma vanity press. É por isso dever de todos nós fazer saber à Saída de Emergência e aos editores da BANG! que não prescindimos da revista e que não prescindimos da revista em papel. Afinal, é a única que temos."


Hum... eu gostei bastante que a Bang! voltasse ao papel e sou da opinião que se deve manter assim por muito tempo. Agora que ela é a única revista é que não concordo nada. A Dagon está à venda, o segundo número vai sair este mês com muita ficção e caras novas, artigos de autores que dispensam apresentações como o Lem, poesia galardoada com prémios internacionais de FC, entre muitas outras coisas...está bem viva e assim vai continuar. Também em Abril sai um jornal "conto fantástico" pela Antagonista, de periodicidade mensal, dedicado em exclusivo aos autores portugueses...e vêm aí novidades em termos de fanzines e antologias, que vão mudar muita coisa em Portugal...

E para terminar: daqui a dois ou três anos vamos ver se a Dagon está desaparecida, ou se afinal havia muita gente que estava bem enganada...

Por agora essa tua afirmação só deu para rir, o que até me fez bem pois esta manhã está caótica! Por isso até te agredeço...

Álvaro de Sousa Holstein disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Álvaro de Sousa Holstein disse...

Duas coisas estão claríssimas neste post.
A primeira é um desmedido “carinho” pela Bang que apesar de ter produzido um número bom, está muito longe da excelência, basta ler o conto Na Guerra com Bruxas de Richard Matheson, para facilmente concluir que não é a excelência que se busava, se se faz uma opção desta e sobre os artigos basta dizer que existe um livro do Jacques Bergier, publica vai para muitos anos pela J’ai Lu, intitulado Les Livres Maudits, para além de que a SdE querer passar por benemérita do género, nem lhe fica nada bem. Afinal, diz o Mago Môr que tem tido 30000 mil downloads. Poupem-me.
A segunda, é esse rancor em relação à Dagon que só se entende pelo apego manifestado supra.
Claro que esta dança de cadeiras na direcção da Bang, cria certamente algumas expectativas, mas afinal a Os Meus Livros não morreu.

João Seixas disse...

Bom dia, caríssimos:

Ricardo: Concordo plenamente com a questão da distribuição da BANG!e guardo esperanças de que a SdE consiga alterar essa situação, em vez de - como temo e já ouvi dizer - voltar a circunscrevê-la ao digital.

Quanto à DAGON, concedo que possa ter sido um pouco duro com o número experimental, se tivermos em conta que apenas dispunha do Luís Filipe Silva como autor com créditos firmados para escorar o esforço. Infelizmente, e como sabes, as palmadinhas do "parabéns pelo esforço" não são my cup of tea, e a medida subjectiva do sucesso propalado pelos editores desincentiva qualquer análise menos objectiva.

Roberto,

Ainda bem que te alegrei a manhã. We aim to please. Mas, se estivesse na tua situação, não via muitas razões para rir. Ao contrário do que dizes, não vejo a Dagon à venda em lado nenhum e, lamento ser assim tão directo, enquanto estiver assoaciada a uma vanity press não terá qualquer credibilidade. Daí que sim, reforço a ideia, a BANG! é a única revista dedicada ao Fantástico.

Admiro o teu entusiasmo e dispersão por inúmeros projectos - todos nós já fomos assim, e se acompanhares a história da FC portuguesa desde os anos 80 para cá, verá isso facilmente. As quantidades de sites, e-zines, fanzines, revistas, encontros, convenções, promessas e travessas que ficaram pelo Caminho, mutas vezes injustamente e sem crédito como o Álvaro Holstein te poderá confirmar ainda melhor do que eu.

Falas-me de jornais e de fanzines e de mil coisas mais, mas a verdade é que o que existe até agora, o projecto DAGON não mostrou ter sequer conteúdo de qualidade suficiente para assegurar uma revista, quanto mais toda essa panóplia de projectos. É, infelizmentem a crua realidade do nosso país. Nada que me impeça de te desejar a melhor sorte, mas se todas as novidades se traduzirem em apostas de qualidade como os últimos autores a surgir pelas chancelas que falas - Carla Ribeiro, etc... - então não são novidades, são apenas ilusões.

Daqui a dois ou três anos, dizes muito bem, veremos s a Dagon existe ou não. Curiosamente, nem imaginas a quantidade de vezes que já usei essa expressão...

Álvaro,

Admito o carinho pela BANG!, com admito o carinho por tudo de bom que se faz pelo Fantástico em Portugal, como é o caso do teu MEMÓRIAS DA FC que acho uma iniciativa excelente, mas que também está longe da excelência.

Mas é inegável que a BANG! tem feito um trabalho de excelência em prol do Fantástico e que, até agora, revelou ou divulgou mais nomes do Fantástico do que qualquer outra publicação do género em Portugal.

A apreciação do conto do Matheson tem uma componente forte de subjectividade e, se é certo que não é dos melhores contos do autor, também está longe de ser um mau conto.

Não vou defender aqui o número de downloads da BANG!, que não conheço (e não me dou com Magos), mas não me espanta uma grande variação entre o número de dowloads e o número de exemplares físicos vendidos. As borlas ainda são uma instituição nacional.

Quanto à Dagon, ver supra. É de lamentar que uma apreciação objectiva seja encarada como rancor, mas tal como a beleza, os motivos ulteriores estão frequentemente nos olhos de quem os vê. Mas se conseguires defender o conteúdo do número experimental da DAGON! (e dispenso-te de comentares os textos do LFS) à luz de um critério por mais ínfimo que seja de qualidade, leria com todo o agrado.

E por fim, sim, é verdade, a OML está de volta à BANG! - perdão, às bancas ;) - já em Maio, continuando a apostar numa divulgação e crítica do que se vai editando no reino do Fantástico em Portugal, by yours truely.

Unknown disse...

Refere que "não vejo a Dagon à venda em lado nenhum", posso desde já informar que a adquiri no site da editora.

Gostaria que me informasse onde posso adquirir a Bang sem ser pelo mesmo meio.

O comentário de que a Dagon perde credibilidade com o facto de estar associada a uma vanity press, não se entende. Afinal nada tem haver com o conteúdo e visto que a Dagon não tem uma editora como a SdE a apoia-la, mais será de louvar o esforço.

João Seixas disse...

Cara Marcelina,

A mecânica de funcionamento das vanities é velha e bem conhecida. Uma vanity publica os seus "autores" (e se é certo que alguns aspirantes a autores, mais incautos ou menos conhecedores, podem cair no engôdo, ninguém publica voluntariamente numa vanity se não estiver consciente da falta de qualidade daquilo que escreve)servindo-se deles para financiar a edição e obter um lucro que, em termos jurídicos, se poderia considerar "enriquecimento sem causa" não fosse a ingenuidade de quem cai nesses esquemas.

No processo, e necessariamente, as vanities não têm considerações editoriais ou exigências de qualidade naquilo que publicam, não sendo portanto "Editoras" no sentido correcto do termo. Como resultado inevitável, degrada-se a qualidade e a seriedade do que é publicado.

É, de uma ponta a outra, um processo sem credibilidade alguma, servindo apenas para acrescentar um intermediário naquilo que eram as velhinhas "edições de autor".

Só que onde essas edições eram honestas - o autor pedia um orçamento para um número determinado de exemplares com determinadas caraterísticas, pegava o preço e apresentava o texto como edição de autor - este intermediário mascara-se de editora, assim enganando os seus "autores". Porque, nunca é demais repetir (e ressalvadas algumas excepções válidas que podem justificar uma edição de autor), um autor NUNCA deve pagar para ver o seu trabalho publicado e comercializado.

Daí que, associar-se a uma vanity, descredibiliza quem o faz, pois transmite a ideia - que não sei se é que acontece no caso da DAGON ou não - de que sabe o que se passa e pactua com isso. Tanto mais quanto existem alternativas claras às vanities, como é o caso de vários serviços de PoD.

Pelo exposto, parece-me que fica respondida, também, a sua questão quanto ao local da compra e a sua relevância.

E, como bem observa, nada disto tem a ver com o conteúdo da DAGON #1, que não conheço, mas que "leva por tabela" devido à associação.

No mais, não tenho por princípio louvar esforços assentes apenas na vaidade. Admiro os "beautiful loosers" de que falava Leonard Cohen, mas o esforço do ego raramente é belo.

Flávio Gonçalves disse...

Apreciação objectiva? Mas se você nos comentário anterior refere que "nada disto tem a ver com o conteúdo da DAGON #1, que não conheço, mas que 'leva por tabela' devido à associação" ao mesmo tempo que nos comentários anteriores chacina a qualidade dos textos da mesma que, a avaliar pelo seu último comentário, nem se dignou a ler.

Fica-lhe bem elogiar o trabalho do Luís Filipe Silva, mas desconsiderar tão prontamente a Carla Ribeiro, o João Barreiros, o Nuno Fonseca e o Lavie Tidhar parece-lhe objectivo?

Parece-me desconsideração gratuita, pedantismo até.

João Seixas disse...

Flávio,

Quando se fala em termos objectivos, e se aparece numa caixa de comentários com a intuito de justificar ou defender uma posição, deve dar-se primeiro ao trabalho de ler os textos com sentido crítico e...objectivo.

Assim:

1) repare bem no que eu escrevo quanto à Dagon no meu post: "sobretudo depois de a esperança prometida pela Dagon se ter desvanecido com um número experimental verdadeiramente medíocre e o subsequente desaparecimento nos esconsos de uma vanity press." Como observará, refiro-me apenas ao número experimental, on-line, que li de fio a pavio.

2) O que eu escrevi no comentário anterior referindo-me à Dagon #1 - que assumidamente não li - foi em resposta a este excerto do comentário da Maecelina Gama: "O comentário de que a Dagon perde credibilidade com o facto de estar associada a uma vanity press, não se entende. Afinal nada tem haver com o conteúdo e visto que a Dagon não tem uma editora como a SdE a apoia-la, mais será de louvar o esforço."

Na primeira situação faço um julgamento de mérito do conteúdo do #0, na segunda explico porque razão, independentemente da qualidade do conteúdo, uma revista, seja ela qual for, perde credibilidade por estar associada a uma vanity, seja ela qual for.

Quanto ao mais, e como sabe se costuma ler este blogue, e se realmente leu o post que escrevi, ao invés de pretender apenas vir aqui defender a honra alheia (o que só lhe fica bem), nunca desconsiderei nem desconsideraria nenhum autor e muito menos o João Barreiros e o Luís Filipe Silva (com quem colaboro em vários projecto há muitos anos) ou o Lavie Tidhar, ou sequer a Carla Ribeiro.

Poderia, como faço frequentemente, desconsiderar o seu trabalho, como faço frequentemente se e quando este não apresentar qualidade. Nos exemplos que cita (nenhum deles publicados na Dagon #0), apenas o da Carla Ribeiro, pelo que li, mereceria essa desconsideração.

Espero que tenha sido reposta a objectividade em falta.

Unknown disse...

Caro João,

O seu comentário fez-me sorrir na seguinte linha: "Uma vanity publica os seus "autores".

Bem por onde começar... digamos apenas, sem ter aqui ao pé a Bang, que junto com a encomenda da revista em causa, recebi 2 suplementos publicitários sobre livros que a SdE está a lançar/editar.
Olhando depois para o conteúdo da mesma, verificamos que temos uma pagina de publicidade a separar cada conto. Por fim a revista tem na sua maioria contos dos autores da casa. Dos que saem regularmente, mais parece, que a Bang serviu apenas para "publica os seus "autores"".

Nada tenho contra a Bang, ao contrário do que parece, contudo acho esta má vontade contra a Dagon, um acto desnecessário de "bota abaixo".

Quanto ao resto do seu comentário, teríamos ali conversa para muitas linhas, contudo parece-me inútil.

Flávio Gonçalves disse...

Realmente, como não indicou a numeração "0" julguei que se referia ao Nº 1, que a própria editora lançou somente numa tiragem de 100 exemplares, logo de teste, antes de a normalizar - se não mudaram de ideias - em tiragens de 200 exemplares a partir do 2º número.

Não tenho opinião sobre o número zero, uma vez que o saquei, imprimi, e encontra-se há muitos e muitos meses ao lado das Asimov's, Black Static e Locus que tenho amontoadas na cabeceira à espera de um tempo livre para as ler.

Mea Culpa portanto.

João Seixas disse...

Caro Flávio,

Nestas situações, o importante é que as coisas se esclareçam e não apurar culpas.

De qualquer forma, obrigado pela atitude.

João Seixas disse...

«O seu comentário fez-me sorrir na seguinte linha: "Uma vanity publica os seus "autores".»

Cara Marcelina,

Repare que as aspas encontram-se em AUTORES não nos SEUS. Não lhe parece que o sentido é totalmente outro...?