sábado, 9 de agosto de 2008

Brightness falls from the air...



Por volta das onze horas e um minuto da manhã do dia 9 de Agosto de 1945, uma abertura na cobertura de nuvens permitiu ao artilheiro do B-29 "Bockscars", capitão Kermit Beahan, localizar visualmente o alvo do segundo bombardeamento atómico da história da humanidade. A Fat Man, prevista para atingir a cidade de Kokura, acabou por ser lançada sobre Nagasaki, alvo secundário, devido à cobertura de nuvens que impedia completamente a visibilidade sobre o alvo principal.



A bomba mergulhou durante quarenta e três segundos, antes de deflagrar a cerca de 469 metros de altitude, resultando num raio de destruição total de mil e seiscentos metros, e riginando a deflagração de incêndios numa extensão de três mil e duzentos metros através da zona norte da cidade.



A explosão sobre Nagasaki, apenas três dias após a destruição similar de Hiroshima, obrigaram à rendição incondicional do Japão, tornando desnecessários outros bombardeamentos semelhantes. No entanto, o exército norte-americano aguardava ter disponíveis para utilização outras sete bombas entre Agosto e Outubro, para apoioar a planeada invasão do território japonês.



Certamente, o mundo teria sido muito diferente se o uso de armas atómicas não se tivesse confinado àquelas duas manhãs que a História não nos permitirá jamais esquecer. As páginas da ficção científica, porém, são ricas em cenários pós-apocalípticos provocados por um uso incontrolado do arsenal nuclear que se foi acumulando durante a guerra fria. Não duvido, como Bradbury afirmou certa vez, que a obsessão que a FC manifestou com o horror nuclear entre os anos 50 e 80 do século XX, foi em grande parte responsável pela contenção no uso dessas armas. Também não duvido, que as suas disparatadas historietas de mutantes radioactivos e gigantescos insectos geraram grande parte da aversão ao nuclear que nos tem mantindo estupidamente reféns do uso do petróleo.



Em The Imagination of Disaster, um ensaio influente mas não muito elaborado, incluido no volume Against Interpretation (1966), Susan Sontag, referindo-se apenas aos filmes de FC dos anos 50, reconhece aquele que é (indubitavelmente) um dos maiores prazeres do visionamento desses filmes (e, diria eu, da leitura de algumas obras do género), ao escrever que " science fiction film is concerned with the aesthetics of destruction, with the peculiar beauties to be found in wreaking havoc, making a mess" (p.213).



Essa estética da destruição, emergiria dos perigos naturais do (ab)uso da ciência e da tecnologia, ampliados à última potência pelo símbolo desse (ab)uso, a Bomba, a ponto de Sontag identificar em todas as ameaças futuras ou alienígenas da FC, uma metáfora para esse espectro damocleano em constante pendência sobre o cachaço da humanidade.



Embora Sontag exclua o prazer estético da destruição, da literatura de FC ("But in place of an intellectual workout, they can supply something the novels can never provide—sensuous elaboration", p.212), não nos é difícil reconhecer essa elaboração sensual na própria literatura, de tal forma que será válida para ambos os meios a afirmação de que "(...) one can participate in the fantasy of living through one’s own death and more, the death of cities, the destruction of humanity itself" (idem).

Por vezes interrogo-me que teria pensado Sontag se tivesse lido a saga da Purple Invasion, nas páginas do Operator #5? Pese embora ter protagonizado 48 aventuras entre Abril de 1934 e Dezembro de 1939, escritas por Frederick C. Davis e Emile C. Tepperman, sob o pseudónimo editorial Curtis Steele (informações mais pormenorizadas podem encontrar-se no incontornável The Great Pulp Heroes (1996,2007) de Don Hutchinson), o Ás do Serviço Secreto norte-americano ficou na memória dos leitores pelas treze últimas novelas, as quais constituem a narrativa (inacabada) da invasão dos Estados Unidos pelos exércitos de Rudolfo I da Bulkaria, o Imperador Púrpura.

Ao longo das treze desesperantes aventuras, onde parece ser impossível derrotar as tropas invasoras, apesar do heroísmo dos rsistentes (em alguns trechos, é fácil encontrar momentos percursores de outros encontrados no Red Dawn (1984) de John Millius), os Estados Unidos são varridos por armas extremamente avançadas, numa sucessão de calamidades, derrotas e reveses que só a inflamada escrita pulp consegue transmitir adequadamente.



Há, porém, no último número publicado (The Army From Underground, em Dezembro de 1939), uma passagem profética, cuja leitura ainda hoje provoca arrepios na espinha:

Soon they reached the edge of the recognizable ruins and were picking their way through a desolation that resembled the debris-littered trail of a devastating tornado. Wreckage encompassed them on every side. Tall buildings had been flattened, stout steel girders twisted and snapped, concrete shattered and crumbled. Streets had ceased to exist, except as barely distinguishable canyons through the mounds of litter. And nowhere was there a living human being... only mangled, half-burned corpses to indicate that this stricken wilderness had once been a great city. (...)
«Everything is destroyed», one dazed worker told them as he tore away tumbled wreckage in an attempt to reach a screaming woman pinned beneath the debris. «Philadelphia is wiped out... everything but the suburbs. It'a all gone - disappeared. Houses, cellars, bomb-proof shelters - all blown to nothing.»
His incredible words were all too true. Operator #5 found them corroborated even before the grey light of dawn revealed the tremendous crater that was the huge empty grave of the Quaker City. Philadelphia had been utterly obliterated, wiped from the face of the earth - with a loss of life that probably would reach a million!
«They never had a chance», he said bitterly as he stared out over that terrible waste. «This is the most ghastly mass murder the world has ever seen - the most heinous crime ever committed agains an innocent and defenseless people!»
A primeira bomba atómica tinha sido lançada sobre os Estados Unidos.

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