Destroços. A nave que se quis indómita jaz desfeita e
abandonada.
Os arquivos mortos e empoeirados, esperando mão caridosa que
desenferruje os gavetões; os sistemas off-line,
dormitando sob plásticos que pouco protegem como indigentes fugindo do
esquecimento.
Regresso ao blogue volvidos que são ano e meio sobre o
último post significativo que por
aqui publiquei. Desde essa altura, e como diria o velho sabujo de má memória,
“o mundo mudou”. Inventaram-se primaveras árabes, depuseram-se ditadores e
aliados, e por cá, neste arabesco lateral e periférico, mudou-se finalmente, o
governo, a forma de governar, e a forma de ver o país. Não chega, não foi da
melhor maneira, mas foi um primeiro passo. Porém, no que aqui nos interessa,
nada mudou realmente. O mercado livreiro encolheu-se um pouco, a OS MEUS LIVROS desapareceu mais uma
vez, desta feita (aparentemente) sem retorno possível, mas o Fantástico, esse
termo que cada vez mais abomino, continua a arrastar-se, sem forma ou
substância, rumo à irrelevância final. É verdade que se publicaram mais alguns
livros, que se organizaram mais alguns eventos, que se assistiu a incursões da
academia na área do Fantástico e do Fantástico na área da academia – mas todas
elas tiveram um sabor estranho e amargo. O Fantástico Português ainda não
alcançou o País: este viu-se reduzido, da pior e mais violenta forma, à sua
verdadeira e irrelevante significância. No Fantástico ainda continuamos
convencidos de que as coisas estão… qual será o termo? Fantásticas? Hmmmf.
Em 2011 publicou-se aquele que será, provavelmente o mais
importante livro de literatura de género desta segunda década do século XXI, em
Portugal. De sua designação OS ANOS DE
OURO DA PULP FICTION PORTUGUESA (Saída de Emergência), parece-me que foram
poucos aqueles que alcançaram as cabais implicações daquele magnífico retrato
de uma história literária que podia ter sido. Foi um projecto de envergadura e
arrojo, desenquadrado do nosso panorama deprimente e, por isso mesmo, serviu
também para nos fazer notar o paupérrimo estado de coisas na nossa literatura.
Derivativo é o qualificativo que cada vez mais se nos oferece com direitos de
cidade. Mostrarem-nos como as coisas poderiam ter sido, ilumina cabalmente as
coisas como elas são e, sobretudo, como elas não são.
Mas regressar à actividade bloguística após todos estes
meses não pode ser um exercício pautado pela desilusão e pelo desânimo. A
verdade é que a miséria reinante apenas permite progredir. Pior é possível,
claro que sim, mas pouco desejável. Mas relendo textos pretéritos, varrendo do
chão os cacos de todos estes propósitos, que fica por fazer? Gerar mais
propósitos e consequentemente, mais cacos? Mais projectos estéreis? Bah, para
quê?
No espaço de uma semana são apresentadas ao público duas
novas antologias: LISBOA NO ANO 2000
(organizada por João Barreiros para a Saída de Emergência) e MENSAGEIROS DAS ESTRELAS (organizada por Octávio dos Santos para a Fronteira do Caos). São duas colecções de ficção
curta com propósitos tão díspares quanto ambiciosos. De ambas participei um
pouco, em fases distintas da sua gestação; no resultado final, a minha presença
apenas será sentida na de Octávio dos Santos, que generosamente nela incluiu um
mal-amanhado conto meu, O Confessor. São duas antologias
que não podiam ser mais diferentes, mas, numa e outra, numa ou noutra
capacidade, senti uma vez mais aquilo que nunca desaparece: uma paixão pelos
meus géneros favoritos. E, se há uma coisa de que me apercebo, é que por muitas
voltas que dê, por muitas traições que lhe cometa, pelas muitas vezes que por
vezes lhe volte as costas, continuo a ter pela Ficção Científica a mais
desvairada das paixões.
Daí que tenha decidido, como propósito de retomar a
actividade no BLADE
RUNNER, que doravante este se dedicará exclusivamente ao meu género
de eleição. Daqui em diante, e salvo raras e honrosas excepções, debruçar-me-ei
apenas sobre a Ficção Científica, seja com a objectividade do Crítico que,
apesar de tudo, ainda sou, seja com a subjectividade do entusiasta com eternos
doze anos que nunca deixei de ser.
Mas porque acima de tudo urge ser realista, sei que não
conseguirei manter um ritmo de actualizações que me satisfaça cabalmente, pelo
que aponto para uma periodicidade rara – uma vez por semana será o objectivo,
mais como meta do que como promessa.
E porque as paixões são voláteis, e porque sei que volta e
meia sentirei a tentação de abordar o Horror, resolvi criar uma válvula de
escape para as pulsões mais subterrâneas, uma válvula com quatro escoadouros,
que podem ser encontrados clicando nas imagens abaixo.
As actualizações,
meramente ocasionais, serão devidamente assinaladas na barra lateral do blogue,
sob a epígrafe “Now Playing in a Blog
Near You”.
Ora bem, renovados os votos, sumariamente manifestados os
propósitos, limpos o pó e as teias de aranha, reparado quanto possível o casco
deste foguete de voos baixos, resta colocar os sistemas novamente on-line,
desempoeirar os arquivos da memória e da experiência e aguardar que os motores
desenvolvam potência.
Como diria o Comandante Picard: warp speed: engage!
3 comentários:
Bem-vindo de volta, João! E, não, o teu conto não é «mal-amanhado»!
Muito bem vindo novamente!
Estava a ver que o teu blog teria que cair na secção 'MOST OF THEM DIED INSTANTLY. A FEW HAD TIME TO GO QUIETLY NUTS.' !
Tenho de ver se ponho as mãos num desses exemplares. Gostava de ler o teu conto.
Felicidades.
Olá Octávio e Sofia,
Por muita boa-vontade que o Octávio tenha, o meu conto é, de tudo o que escrevi até hoje, dos que reputo mais fraquinho, porventura devido às causas da sua génese (substituir um texto mais longo, que não conseguiria terminatr em tempo útil).
De qualquer forma, fico curioso por ler as reacções, sendo que nenhuma por muito negativa que seja me chocará, e só as positivas me poderão surpreender.... ;)
(Sem com isso querer beliscar os dotes editoriais do Octávio - quero acreditar que pelo menos soube identificar um autor capaz sob o texto...)
Quanto ao blogue ir parar àquela secção, ficaria na dúvida se teria que ir para os que morreram instantaneamente, ou para os que enlouqueceram lentamente (lembram-se de que filme era esta citação?), mas em qualquer uma delas, ficaria em boa companhia...
À cautela, procuremos evitar esse destino no futuro próximo.
Obrigado a ambos pelo apoio, e continuem a passar por cá.
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