quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Deja Vu: Gótica (Clara Tahoces, 2007)




Bico de Pena, 2008
Tradução de Catarina Fonte
ISBN: 978-989-621-072-4
302 Páginas

Clara Tahoces é uma conhecida “jornalista” espanhola, dedicada aos temas das ditas “ciências ocultas”, facto que transborda desconfortavelmente da composição desta sua quarta novela, galardoada com o Prémio Minotauro em 2007. Gótica é uma corriqueira história de vampiros – ou mais concretamente, vampiras – que pretende disfarçar a total falta de originalidade através de alguma desmistificação dos elementos canónicos dos não-vivos, como sejam a incapacidade de suportar a luz solar ou a impossibilidade de engravidarem. Porém, ao fazê-lo, faz tábua rasa de outras variações anteriores, por mãos de autores bem mais capazes, apresentando-nos uma descarada reinvenção da roda que em nada é beneficiada por uma trama de acção demasiado assente em coincidências e comportamentos ilógicos por parte das personagens. Os leitores de Anne Rice ou Charlaine Harris não encontrarão aqui nada de novo, mas os fãs entusiastas de Stephenie Meyer podem retirar algum prazer de uma versão (pouco) mais adulta de um tema similar.



Uma versão ligeiramente diferente deste texto surgiu na OS MEUS LIVROS #74, Abril de 2009

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Um Ansiado Regresso: As Correntes da Inquisição (Valerio Evangelisti, 1995)




Edições Asa, 2008
Tradução de Regina Valente
ISBN: 978-989-230319-2
256 Páginas



As Correntes da Inquisição” é o segundo dos nove volumes que Valério Evangelisti dedicou, até à data, ao Inquisidor-Geral do Reino de Aragão, Nicolas Eymerich; e, tal como o volume anterior publicado pela Asa em 2006, é um soberbo exemplo de como a exímia mescla de géneros literários – a Ficção Científica, o Romance Histórico, o Policial e o Horror – permite revitalizar uma literatura nacional (neste caso, a Italiana), ao mesmo tempo que reconhece a influência de Umberto Eco na adaptação das receitas genéricas à Literatura Erudita.

Baseado numa personagem real, à qual a formação em ciências Histórico-Políticas de Evangelisti dá corpo e dimensão, Nicolas Eymerich assume-se como uma das mais icónicas personagens da literatura fantástica, aplicando um intelecto portentoso à defesa de uma fé eminentemente irracional. É aí, porém, que reside o grande mérito de Evangelisti, que evita uma abordagem simples e simplista do fenómeno do mal e da religião, dois fenómenos tão intimamente ligados como gémeos siameses e, ao invés, explora as formas retorcidas pelas quais o pensamento racional reforça por vezes as ideias mais disparatadas. E que melhor panorama histórico poderia existir para confrontar a fé e o intelecto de Eymeric com o mal, do que a Alemanha Nazi e a Roménia de Ceausescu, dois cenários onde o mal foi racionalizado ao extremo?

Uma vez mais, é ao entrelaçar hábil de três cronolinhas concorrentes que a narrativa vais buscar toda a sua força, obrigando o leitor a percorrer caminhos de dor, sofrimento e razão que apenas a mente humana soube e sabe criar. Uma série a não perder.

Uma versão ligeiramente diferente deste texto surgiu na OS MEUS LIVROS #73, Março de 2009

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Probabilidades Certeiras: O Ladrão da Tempestade (Chris Wooding, 2006)




Editorial Presença, 2009
Tradução de Miguel Romeira
ISBN: 978-972-23-4088-5
266 Páginas

Chris Wooding (nascido em 1977), autor bem conhecido dos leitores da Colecção Via Láctea, condensa nas escassas 266 páginas deste “O Ladrão da Tempestade” uma riqueza visual e criativa que os jovens autores nacionais publicados na mesma colecção não conseguem igualar em sagas de sete ou oito “tijolos”. Parte dessa riqueza visual emerge do cenário da cidade-ilha Orokos, sujeito a permanentes alterações por via da passagem das tempestades de probabilidades (uma ideia científico-ficcional que vai buscar ecos a Justina Robson, Aldiss e Dick) que tudo alteram à sua passagem, permitindo à narrativa fundir habilmente os registos de fantasia e FC. Mas não só; as referências a uma espécie tecnológica há muito desaparecida e a presença de um golem alado cibernético enriquecem definitivamente a aventura de Rail e Moa, dois jovens ladrões em fuga de um assassino implacável que pretende recuperar um instrumento da antiga tecnologia dos Fade que caiu em seu poder. Uma obra de qualidade superior, que nos faz desejar que toda a literatura infanto-juvenil fosse assinada por Gaiman, Reeves e Wooding.

Uma versão ligeiramente diferente deste texto surgiu na OS MEUS LIVROS #73, Março de 2009

domingo, 13 de dezembro de 2009

À Deriva no Tempo: A Máquina do Tempo Acidental (Joe Haldeman, 2008)




Europa-América, 2008
Tradução de Catarina Fonseca
ISBN: 978-972-1-06965-8
236 Páginas

Quando Matt Fuller apertou no botão REINICIAR do calibrador de que o professor Marsh o encarregara, nunca pensou acabar envolvido no extremo errado de uma investigação criminal, sentado frente a frente com Jesus numa teocracia tenebrosa ou transportado a um futuro que se assemelha bastante àquele que ele conhece. Nas mãos de Haldeman, porém, este acidental viajante no tempo vai conduzir o leitor pelos labirintos da vasta maleabilidade do real quando submetido às pressões da imaginação friamente lógica de um dos mais consistentes autores de FC. Volvidos quase dois anos sobre a publicação do anterior volume da Colecção Nébula, A Máquina do Tempo Acidental vem agora permitir esperança renovada quanto à continuidade de uma colecção que vinha dando a conhecer aos leitores nacionais algumas obras dos autores mais marcantes no género. Seja bem vinda de volta.


Este texto foi originalmente publicado na revista OS MEUS LIVROS #72, Fevereiro de 2009

sábado, 12 de dezembro de 2009

Sonhar o Impossível: A Física do Impossível (Michio Kaku, 2008)




Bizâncio, 2008
Tradução de Luís Leitão
ISBN: 978-972-53-0406-8
329 Páginas


O estudo do impossível, diz-nos Michio Kaku, professor de Física Teórica na Universidade de Nova Iorque e autor da teoria das cordas, abriu panoramas completamente novos para a ciência. Ora, se há género que sempre explorou as promessas de futuro que se escondem nos “impossíveis” da ciência, esse é a Ficção Científica. Nada mais natural, portanto, do que recorrer às tecnologias propostas pelos mundos da imaginação para estabelecer uma interessante hierarquia de impossibilidades, por vezes com resultados surpreendentes. Assim, servindo-se dos mais recentes conhecimentos na área da física moderna, e das mais inventivas tecnologias dos universos da FC, Kaku analisa a viabilidade científica de alguns tropos recorrentes da arte fantástica – a invisibilidade, as armas de raios, a viagem no tempo e a velocidade supraluminosa, os universos paralelos, o teletransporte, etc. – à luz do conhecimento actual e avança uma antevisão do que seria necessário para a sua futura concretização. Os resultados são fascinantes – a forma de efectivamente tornar invisível Harry Potter merecia ser impressa na contracapa dos volumes de Rowling – as anedotas que emergem do passado da Ciência são deliciosas, e a arte com que Kaku transforma um manual de física numa leitura imparável é digna de um mestre. Com a colaboração de Carlos Fiolhais na revisão dos aspectos técnicos da tradução, é um volume de leitura obrigatória para todos os entusiastas da Ciência e da Ficção Científica… mas muito especialmente para os outros.

Uma versão ligeiramente diferente deste texto surgiu na OS MEUS LIVROS #72, Fevereiro de 2009

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Retrato Quântico de um País dos Trópicos: Brasil (Ian McDonald, 2007)




Gailivro, 2008
Tradução de Leonor Bizarro Marques
ISBN: 978-989-557-566-4
503 Páginas



Ian McDonald tem assinado algumas das mais brilhantes obras de ficção científica de lavra mais recente. Por isso, nunca antes foi publicado entre nós. Sem se sentir agrilhoado por um inclemente rigor científico, aplica no que escreve um rigor intelectual que desde logo distingue mesmo as suas mais fabulosas explorações. Por que com McDonald é sempre de explorações que se trata: de Marte no díptico DESOLATION ROAD, de África na saga da invasão da CHAGA, da Índia no recente RIVER OF GODS. Mas de um outro Marte, de uma outra África, de uma outra Índia… e agora, de um outro BRASIL. Ou, para ser mais correcto de uma miríade de potenciais BRASYS (com Y, como no título original) em coexistência quântica. Parece complicado? Mas não é. O que o leitor encontra abrindo este magnífico volume é uma viagem por três épocas da história do Brasil que nunca existiram ou virão a existir: um 2006 subordinado à febre dos reality shows, um 2032 hiper extrapolado da nossa realidade e um 1732 que serve de palco a uma recriação da célebre viagem Congo acima que Conrad nos legou, aqui em busca de um Kurtz jesuíta. A chave para esta pluralidade de mundos ancorados numa realidade Brasileira que se assume – com todas as suas contradições – como alma do tropicalismo, reside nas lâminas quânticas que permitem cortar o universo em finas camadas probabilísticas. McDonald escreve sobre o futuro assenhoreando-se daquela poesia visionária que encantou gerações de leitores de FC… BRASIL é a porta de entrada ideal para os demais leitores e, esperemos, um primeiro passo para a divulgação da obra de um dos melhores escritores dos últimos tempos.

Uma versão ligeiramente diferente deste texto surgiu na OS MEUS LIVROS #71, Janeiro de 2009

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A prenda que o Black Peter vos devia trazer




Parece que foi ontem, mas passaram já quatro anos desde que as Edições Chimpanzé Intelectual se apresentaram ao mercado com um livro de contos de Ficção Científica e Fantástico. Foi um passo ousado para uma pequena editora recém-nascida, e cambaleante como costumam ser as primeiras incursões no inclemente mundo exterior. Mas os pés firmaram-se e foram ganhando força, os projectos foram-se acumulando e ganhando cada vez mais ousadia, interesse e qualidade.

Em 2009, a Chimpanzé Intelectual metamorfoseia-se em Escrit'orio Editora, um projecto mais ambicioso, e a designação que todos fomos aprendendo a apreciar serve agora de chancela a uma colecção de literatura fantástica que estreia sob o melhor dos auspícios com este BRINCA COMIGO E OUTRAS ESTÓRIAS FANTÁSTICAS COM BRINQUEDOS, uma breve antologia de contos temáticos que reune sob a mesma capa os melhores autores nacionais do género. João Barreiros, David Soares, Luís Filipe Silva e João Ventura assinam as quatro narrativas que nos propõem uma exploração em tons negros e cáusticos do mundo encantado dos brinquedos.

A antologia foi cuidadosamente pensada por Miguel Neto em torno da soberba narrativa titular (a única não inédita do volume), e todos os autores foram convidados a trocar ideias entre si para que não ocorressem repetições ou sobreposições temáticas acidentais. Chega-nos, assim, às mãos um precioso mosaico de contos perfeitamente apropriados a este período natalício, sempre enxameado de delicodoces brinquedos que não se comparam aos formidáveis companheiros de brincadeiras que estes quatro autores nos apresentam com inigualável mestria.

Certamente um dos livros do ano, e a prenda ideal para pedir ao Black Peter.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

HOJE PORTUGAL... AMANHÃ O UNIVERSO 2-4/4


Há textos que se perdem na efemeridade de um momento. Isso é particularmente relevante quando o texto proposto pretende ser uma polémica. Sobretudo se uma polémica cuja intenção era a inserção num debate mais alargado em curso noutros blogues no momento da sua redacção. Daí que, passado o momento, não faça já sentido apresentar a conclusão do texto iniciado aqui nos moldes inicialmente previstos. Não quer isso dizer que o discurso iniciado vá ficar eternamente interrompido. Simplesmente, e por mero critério de oportunidade, verá a sua conclusão adiada para o resumo do ano que pretendo apresentar em 31 de Dezembro - aí as ideias deixadas orfãs encontrarão um ninho seguro onde se acolher e articular.

Depois da interrupção do ano passado, pretendo fazer acompanhar essa breve súmula de final de ano pelo meu top-ten pessoal de livros publicados durante o ano de 2009 em Portugal. Para refrescar a memória dos leitores - e a minha própria - decidi re-publicar aqui no Blade Runner as breves críticas (designação imprópria para o que não passa de meras resenhas, e que aqui tratarei como notas de leitura) que escrevi para a OS MEUS LIVROS durante o ano que está prestes a findar. São 20 textos sobre 20 livros muito desiguais, que poderão acompanhar aqui entre 11 e 30 de Dezembro, à razão de um por dia. Nenhum deles é extenso, mas sempre são uma dúzia de palavras mais longos do que as versões que receberam letra de forma na revista impressa.

E já agora, alguém reconhece o filme de que foi retirada a imagem que ilustra este post?

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Contagem Decrescente


Faltam 30 dias para terminar o prazo para apresentação de submissões para a versão nacional do THACKERY T. LAMBSHEAD POCKET GUIDE TO ECCENTRIC & DISCREDITED DISEASES que a Saída de Emergência vai editar em 2010. A antologia original, organizada por Jeff VanderMeer e Mark Roberts é já um objecto de culto um pouco por todo o mundo e a versão portuguesa, enriquecida com textos originais de produção nacional, constituirá certamente uma peça de colecção, única e inovadora.

O prazo de apresentação de originais está a correr desde inícios de Outubro e estende-se até 31 de Dezembro de 2009. Ao contrário do que vem sendo hábito em antologias anteriores, a qualidade das submissões recebidas até ao momento revelou-se bastante acima da média, pelo que não haverá razões que permitam ou justifiquem uma dilação do prazo final. Por isso, quem quiser ver-se perpetuado numa antologia onde pode partilhar o índice com Alan Moore, Neil Gaiman, China Mièville, Paul di Filippo, Jeff VanderMeer, Michael Moorcock e muitos, muitos outros autores de renome, deve lançar mãos à obra e aproveitar ao máximo este mês de Dezembro tão cheio de feriados.

Informações mais detalhadas podem ser encontradas aqui.